segunda-feira, 29 de outubro de 2007

A ronda noturna


Eram encontros proibidos. Deveriam estar protegidos pela escuridão e pelo silêncio sugestivo das ruas. Protegidos dos olhares curiosos e criminosos dos passantes, esgueirando-se nos muros. Contudo, a gravidade de tal empreita merecia todo o devido cuidado.
Cuidaram dos secretos encontros, às escuras, e os segredaram dos possíveis ouvintes, delatores. Somente um cúmplice compartilhava de tal embuste: eu, impositivamente. Delegaram-me vigia desse caso promíscuo.
Deveria fazer a noturna ronda que os livraria da surpresa da descoberta inoportuna. Cada beijo, carícia ou ato cometido deveria ser protegido por um conciso sinal. Deveria gritar a cada sombra que se aproximasse, fosse humana ou animal. Matar, se preciso.
Cada noite, cada encontro, postava-me vegetalmente na vaga sugerida de minha vigia atenta. Observava os intensos e breves passos, dos estranhos, sem nome, nas calçadas e o mínimo movimento me despertava horrores. Dava a sentença, por código, para que se apartassem, do que estivessem fazendo. Mas passado o assombro, devia dar o comando de liberação. O esperado comando, no qual os dois, postados aguardavam sempre, com os olhos aviltados pela escuridão.
Mantinha os dois a salvo e me punha em perigo. Só e solitariamente envolvido, por longas noites. A constância dos encontros e a intensidade do caso que se desenvolvia começara a despertar suspeitas. Todo vil olho que a nós se dirigia, olhava com olhar de projétil, a sugerir preceitos. Comecei a considerar a possibilidade da revelação e enfim, do final desastre. Cada dedo entrelaçado nos desejados corpos falavam mais que minhas espúrias palavras sem motivação, vãs. E eu, cúmplice e confidente era brigado a promover e me proteger.
Ainda assim continuei a acompanhar o proibido caso, até o terrível desfecho, que todos já devem supor...
Sim, terrível desfecho, que passado tanto tempo, nem consigo recordar.

12 comentários:

(Marta Selva) disse...

adorei seu blog, sr cronista.
passarei sempre,posso?

AB disse...

Mas eu quero saber o desfecho!!!!

Vinícius Rodovalho disse...

Pois é: o desfecho!? Rs.

Como sempre, ótimo texto. E tal postura exige uma paciência absurda. Entendo sua insatisfação.

Mas eles que tratassem de se proteger sozinhos. Rs.

Até mais.

MM disse...

Me senti lendo Madama Bugary. Muito bom!

Bel disse...

Não consegue recordar? Tá bom, então eu vou te lembrar:

Você olhou não somente em volta, fazendo sua vigília incessante, mas voltou seus olhos também para o casal de amantes. E, mais do que para os dedos entrelaçados, para as bocas que se tocavam, você olhou para ela... e, inevitavelmente apaixonou-se.

Então, por não suportar mais ver seu objeto de desejo e paixão entregue sempre aos braços alheios, você mesmo se encarregou de contar exatamente a quem jamais poderia saber. (Eu não sei quem...) Só para depois consolá-la. E o resto da história agora você já sabe!!!

Obrigada pela visita, vou voltar por aqui também...

disse...

Uma ótima sacada essa de deixar o final em aberto. Belíssima narração. Ao final da Bel eu só faria um acréscimo, ou alteração, caso o texto fosse meu. Você mataria seu rival, para que ela fosse toda sua. Mas ela, chocada com seu gesto, fugiria de você eternamente.

Não gosto de finais trágicos. :-P

parabéns pelo blog, moço.

Bjs. Voltarei sempre que puder.

disse...

Errata: GOSTO de finais trágicos.

disse...

Vc tem razão quanto ao comentário lá no meu blog. A minha idéia foi eternizá-los. Pq não, não é? Já que tanta gente pode se identificar com eles e viver um momento de nostalgia... Estou escrevendo uma série baseada em diálogos. :-P É claro que com algumas adaptações.

Jaya Magalhães disse...

Como assiiiiim? Eu quero o desfecho! Rs. Isso é muito injusto.

Agora olha, lendo ali o desfecho que Bel propôs, eu tenho mais é que concordar e me tranquilizar por algum ter colocado um fim na minha angústia. Rs.

Beijo!
=*

Liana disse...

comento tambem,sim!!
Muito bom teu blog!!

bju*

Anônimo disse...

Nossa, me arrepiei...
Não é difícil imginar desfecho de todo esse místério. Não, não é...
Gostei muito de te ler, não parei nem pra piscar.
Obgada por me visitar e pelo elogio. Tenho realmente uma forma simples de escrever, nem sei se boa...Mas, simples.
Voltarei!
Bjus.

Anônimo disse...

Só pela terceira tentativa que eu fui conseguir terminar de ler esse texto... ae me deparo com um texto sem fim! Poxa vida! Sacanagem!!

shAshaUIhsuaihs

Textos assim, abrem-nos a imaginação!