domingo, 16 de março de 2008

Amenidade.

A conversa seguia agradável por entre os puffs pretos enfumaçados pelos cigarros alheios e nos surpreendemos falando longamente de animais.
Logo confidenciou-me:
- Adoro animais! Tenho um papagaio e um cão!
Ri timidamente, sem mostrar os dentes e completei:
- Nossa, então sua casa é quase um pet shop. Com um cachorro, um papagaio e uma gata!
E surpresa, respondeu:
- Mas eu não tenho uma gata.
Aproximei-me do ouvido e sussurrei pausadamente:
- A gata é a dona!

quarta-feira, 12 de março de 2008

Eu quis.


Quem nunca quis descer uma escada rolante que subia?
Quem nunca quis ousar gritar bem alto no meio da rua; estar sem meias e que ninguém notasse.

Quem nunca quis viver um grande amor.

Muitos, creio, já quiseram que o sorvete não derretesse e que a gente não se machucasse, como nos desenhos da tv. E que a celulite tivesse cura, assim como a ingratidão.

Quem nunca quis seguir carreira artística e já chorou com tudo isso. Que quis estar em dois lugares ao mesmo tempo e já desejou que Newton ou outro aí tivesse inventado o “tele transporte”. Seria bom. Seria exatamente bom se houvesse mais pizzas nos finais de semana, e nos finais de semana de todo o mundo. E que houvessem mais presentes no natal, menos comida no natal e mais no resto do ano, no ano de todo mundo.

Quem nunca quis viver um grande amor.

Quem nunca sonhou e quis que eles nunca se realizassem. Quem nunca quis comer pipoca uma tarde inteira; assistir sessão da tarde a vida toda. Tocar a campainha e sair correndo. E que o telefone tocasse agora. Que tivesse dinheiro, um amigo, uma saudade. E nunca fosse pego em flagrante e que contasse uma mentira pra ser feliz.

Quem nunca quis viver um grande amor.

Quem nunca desejou a morte e se arrependeu. Quem desejou e a encontrou. Quem já quis sair do elevador; sair de casa e poder voltar. Quem nunca quis que as pernas agüentassem um dia de trabalho e uma noite de amor.

Quem nunca quis viver um grande amor. E que ele não acabasse. Mas o amor acaba.

Quem nunca desejou ser a alguém essencial. A um amigo, amante, cão, vegetal, ao gerente do banco, às estatísticas e a um estranho, afinal.

Quem nunca quis viver um grande amor e se fodeu?

domingo, 2 de março de 2008

Insana noite



Estive a noite toda esperando
Por alguém que não iria chegar.
E, mesmo a noite toda velando,
Tenaz, resisti em acreditar.

Talvez eu já soubesse,
Do seu cruel intento,
Mas talvez eu não quisesse
Dar razão ao pensamento.

A noite tanto prometia,
E, por fim, comprometendo,
Acabou a luz do dia.

A noite, tolamente já não espero
Pra insanamente admirá-la

Agora, não sofro mais quando quero.